segunda-feira, 31 de março de 2008

Salve o Síndico! (Jornal A Gazeta | 15/03/2008)

Tatiana Wuo
twuo@redegazeta.com.br

Em 15 de março de 1998, Tim Maia saía de cena, vítima de uma infecção generalizada. Cantor e compositor de sucesso, Tim morreu depois de tentar fazer mais um dos seus inesquecíveis shows. Rei do R B brasuca, do soul e do balanço, ele deixou órfãos milhares de fãs que não encontraram, depois dele, um outro nome para representar a música cheia de suingue que ele fazia como ninguém, desde o começo da sua carreira, com suas primeiras bandas, Os Tijucanos do Ritmo e, mais tarde, Os Sputniks, com Erasmo Carlos e Roberto Carlos.

Hoje, dez anos depois da sua morte, o Síndico – apelido dado ao cantor por Jorge Ben Jor – ainda dá o que falar. Músicas inéditas do seu trabalho mais "místico", os dois volumes de "Racional", caíram na rede. Trata-se de uma espécie de volume 3, com músicas gravadas na época dos discos originais (em 1975, quando ele se converteu à seita Cultura Racional) e que não foram lançadas. Canções que mostram um lado renegado por Tim anos depois, mas que estão causando burburinho devido ao sucesso de crítica das composições dessa fase.

Aliás, essa é uma das muitas polêmicas da sua carreira, já que o cantor colecionou desafetos por suas atitudes: brigava com seus músicos, faltava a shows, se envolvia com drogas e bebia muito. Tudo era em excesso em sua vida, até mesmo o carinho que recebia dos seus fãs. Por isso, hoje, a data é marcada por lembranças sobre a importância que Tim teve para a história da música no Brasil.

Essa influência é reconhecida por fãs como o professor Juca Fardin, 39. Ele herdou o apreço por Tim da família, que ouvia muito os discos do cantor. "Por isso tenho uma relação afetiva com ele", explica. Colecionador de livros, LPs e CDs do Síndico, sua música preferida e inesquecível é "Vale Tudo" (um esquenta-suvaco dos bons, em expressão do próprio Tim). "Também gosto do lado mela-cueca, como ele mesmo dizia". Aí entram na lista "Me Dê Motivo" e "Um Dia de Domingo". Mas hits não faltaram na carreira de Tim: "Sossego", "Coronel Antônio Bento", "Azul da Cor do Mar" e "Descobridor dos Sete Mares" são alguns dos exemplos.

Carreira e influência
Juca está descobrindo um pouco mais sobre a vida conturbada de Tim ao ler a biografia escrita por Nelson Motta, "Vale Tudo - O Som e a Fúria de Tim Maia" (Editora Objetiva). O livro, que já chegou à marca de 78 mil exemplares vendidos, está na lista dos best-sellers desde novembro.

"Pesquisei a vida dele a fundo, desde o início da carreira, conversei com muitos músicos, parentes, empresários, namoradas, amigas, produtores (todo mundo tem uma história de Tim Maia, né?). O Carmelo Maia, o filho e herdeiro, também colaborou muito com histórias e um sensacional álbum de família de fotos, com o Tim bebê e depois de terno branco fazendo a primeira comunhão. Fiquei chocado: achava que o Tim tinha nascido já com 13 ou 14 anos e com a voz grossa", brinca Motta.

Comparado ao Tim por causa do timbre de voz mais grave, Cláudio Zoli lembra quando ouviu pela primeira vez uma música do Síndico. "Eu era moleque e ia em festas na casa dos meus padrinhos. Lá o pessoal dançava muito a música ‘A Festa de Santo Reis’. Eu devia ter uns dez anos", conta.

Mais tarde, adolescente, Zoli cantava músicas como "Azul da Cor da Mar". "Depois, comecei a ter contato com o Paulinho Guitarra, que tocava com Tim e passei a me interessar por música, fazendo aulas com ele. A partir daí, algumas vezes eu tive a oportunidade de freqüentar os ensaios deles, isso aos 16 anos. Era um orgulho", lembra.

Além de ser uma grande influência para Zoli, Tim Maia foi responsável pela divulgação da música negra americana no Brasil. "Quando ele viajou para os Estados Unidos (Tim ficou por lá entre 1959 e 1963, quando foi deportado por porte de maconha), ele trouxe uma sonoridade nova, uma harmonia nova, que mistura o balanço da música brasileira com o ritmo americano. Ele inventou a soul music nacional", analisa Zoli.

Dividindo o palco
Aos 24 anos, a cantora Alza Alves dividiu o palco com Tim na gravação do DVD "In Concert", especial para TV Globo de 1989. Para ela, o Síndico é uma figura única e incomparável. "Sinto que ele era muito empírico no que fazia. Tinha uma interpretação incrível e muita intensidade na hora de cantar. Era uma referência na concepção de som, no trabalho de arranjo à frente de sua banda, a Vitória Régia, que apesar de toda experiência, ainda assim fazia muitos ensaios", afirma.

Ensaio, a propósito, foi uma coisa que Alza não conseguiu fazer com Tim. "Quando estávamos ensaiando para o show do DVD, ele não apareceu. E olha que os ensaios eram na casa dele. Só fomos encontrar com Tim na passagem de som, no Teatro do Hotel Nacional, onde aconteceu o show. É engraçado porque existe uma história de que ele ficava do quarto, ouvindo o ensaio, e mandava recados para banda através de sua empregada. Não sei se isso verdade, mas é bem a cara do Tim", diverte-se Alza.

# Ouça na web Sucessos do cantor em www.agazeta.com.br


"Tim era único. O fato de a gente não ter mais ele por aqui parece que deu uma esvaziada. Suas canções, sua voz, seu jeito... Tim é eterno, inesquecível"

Cláudio Zoli
cantor e compositor

"Mais grave! Mais médio! Mais agudo!’ Isso tudo era verdade. Mas a insatisfação dele com a mixagem era transformada pelo prazer quando Tim se entregava no palco"

Alza Alves
cantora e professora

"Se pudesse, diria para ele que estou com saudade e que o ‘preto, gordo e cafajeste’, como se dizia Tim, é na verdade um imortal da música, do humor e da liberdade"
Nelson Motta
jornalista e compositor

Manias em terras capixabas

Muito carismático, Tim Maia também era uma pessoa cheia de manias. Cláudio Caubi Figueiredo, vocalista da banda Urublues e assessor de comunicação, até hoje comemora uma delas. Isso porque, quando o grande Síndico fez seu último show em Vitória, no dia 1º de setembro de 1994, no Ginásio Álvares Cabral, para uma platéia de cinco mil pessoas, por causa das suas superstições, Tim acabou pegando uma carona no carro da rádio em que Caubi trabalhava (na época, ele era repórter da Capital FM).

"Tim odiava andar de avião, então ele já desceu no Aeroporto de Vitória com uma garrafa de uísque na mão. Ele bebia para esquecer", conta Caubi. Segundo ele, muita gente esperava Tim no aeroporto e ele deu atenção a todos, especialmente para as crianças.

Para levá-lo ao hotel, uma limusine preta, de veludo vermelho por dentro, foi contratada e o esperava na porta do aeroporto. "A surpresa foi que ele não quis entrar. Disse que parecia um carro de funerária. O povo no aeroporto gritou, dizendo para ele ir de Transcol. Tim saiu andando pela área do estacionamento em direção ao ponto de ônibus. A gente estava com o carro da rádio. Eu abri a porta e chamei ele para entrar", lembra. Tim, sem pestanejar, entrou no carro e Caubi conseguiu uma entrevista exclusiva até o hotel onde ele ficaria hospedado.

fonte:http://gazetaonline.globo.com/jornalagazeta/caderno2.ag/caderno2_materia.php?cd_matia=415359&cd_site=126

Nenhum comentário: